segunda-feira, 25 de abril de 2011

Pedro e a Janela



Pedro a fitava através da pequena janela. Ao ver todos aqueles lugarejos desconhecidos, seus olhos brilhavam com muita atenção. Seria a primeira e a última vez, pensou. "Primeira e talvez... última" repensou.
Ela dentro de suas janelas é um mundo limitado. 
Depois de longas horas de desconforto ali dentro, finalmente ouviu os breques sendo acionados. Enfim parou em seu destino. Pedro, ainda olhando, perguntou com toda a calma se já haviam chegado. Sim, chegamos. Pegou suas malas e saiu. Pedro não aguentou o peso e largou as bagagens no chão. Ficou paralisado durante alguns instantes. Encantou-se com tamanha imensidão. Não era tão limitada. Ficou parado ali. Até que ela chegou perto dele pra sentir a mesma felicidade. Estavam, em pé, um em frente a janela do outro, a respiração quente embaçava os vidros.
"No fundo, acho que não gostei" disse Pedro, quase sem voz. "Nem eu", respondeu.
Pedro continuou ali, sentado sem dizer mais nada. A única coisa que fazia era olhar, através da fumaça, o pouco que conseguia enxergar. Fazia frio. Contemplavam em silêncio um ao outro. O silêncio deixava-os a sós.
Pedro sentia-se sonolento. Suas pernas formigavam. Já não sentia-se mais feliz. Tratou tudo secamente. Ela, sem dizer boa noite, virou-se e caminhou para o outro lado da rua.
A fumaça e a leve garoa que começara impediu Pedro de ver para onde fora. 
Pedro olhava e já sentia saudade de pensar que aquela seria a última vez. Consequência? Silêncio. Tão absoluto que ouvia-se o piscar de seus olhos. Dia após dia eram vistos pelas janelas, expressando atos de frieza. Mais frios do que o outro dia. Pedro, a fumaça, a garoa e o frio, lamentaram. Foram para casa sem sorriso, sem ninguém. 

2 comentários:

Anônimo disse...

A janela é vidro: translúcida mas dura. Por onde passam livres os olhos, mas que enganam as mãos muito afobadas. As moscas e as abelhas esquecem a dureza do vidro e batem eternamente as asas na altura em que estão os olhos. Em vão.

A fumaça ofusca o olho turvo, revelando então a parede que é o vidro.

De limitada a imensidão não tem nada. Cresce do outro lado a uma só olhada. Reluz espada, fumaça cortada, vento rajada. Imenso, cresce, imenso... Parede vidro estilhaçada. 

Ao ar, o silêncio negro da janela em cacos.

Ser mosca, ser abelha? Ser homem de bagagem cheia? A mulher é vidro ou espelha? O que faz da luz de meus olhos? Mas que culpa tem se lhe juro incertezas? Está certo das incertezas? E a beleza do vidro embaçado, não pela fumaça fosca, mas pelo respirado? E o imenso que cresce violento? É afinal seco ou molhado?

O silêncio piscou os olhos. Ao abrir, já nem mais cacos havia.

Silvia VC disse...

A beleza dessa nossa palavra nua, sem vergonha - de se mostrar - reside entre esta emoção palpável e os sentimentos que deixam esse nosso coração latente pulsar. Batendo, batendo e batendo, sempre no vidro, esse de fronteiras infinitas, que nos separa e distantes nos diz para continuar. Olha-se em constância, mas pouco se vê, vê-se pouco e menos ainda se repara. Entre as tantas incertezas e inquisições humanas, pouco se ouve do sábio ancião: se podes olhar, vê. Se podes ver, repara.

(Escrevi agora, mas foi para meu livro, emoção entre sentidos que foi roubada)

Uma das coisas mais bonitas, suas, que eu já li. Mostra que é pura e venerável essa inspiração ;)